segunda-feira, maio 26

Brasil 1950: A mãe de todas derrotas

O destino e a raça uruguaia não permitiram que eles vencessem a Copa.
1942. Este era o ano em que a Copa deveria ter sido realizada no Brasil. Acontece que a Guerra mudou os planos. E em 1946 o mundo ainda estava muito destroçado para pensar em uma Copa. Tanto é que só em 1948 foram realizadas as Olimpíadas de Londres. Assim como agora, o Brasil teve um tempo que nenhuma outra não nação teria antes ou depois. No passado foram 12 anos. Agora 11. Assim como agora, diversas obras perderam o prazo. Tem até esta imagem para provar:

Eis o Padrão FIFA de 1950.
Essa foto é da abertura do estádio, na partida entre Brasil e México. Aliás, a Copa após ter tido as duas últimas edições com 16 seleções ( mesmo que a Áustria tenha tomado o primeiro e único WO da história das Copas em 38 ), a quantidade de países caiu para 13, o mesmo de 30. Os motivos foram os mais diversos: a Alemanha estava proibida de competir, Portugal, Escócia, Índia e Escócia desistiram de vir. A Itália veio com um time remendado e de navio, reflexo da tragédia de Superga um ano antes, quando a base da seleção que jogava no Torino desaparecera num acidente de avião. Os 13 participantes estavam assim espalhados pelos continentes:
  • América do Sul: Brasil, Uruguai, Paraguai, Bolívia e Chile;
  • América do Norte: Estados Unidos e México;
  • Europa: Itália, Suécia, Suíça, Espanha, Iugoslávia e Inglaterra.
Dá para perceber que não fossem nossos vizinhos Paraguai, Bolívia e Chile a Copa seria um fracasso a Copa. E estes países foram chamados 2 meses antes da Copa. Outros tempos, com certeza. Os grupos ficaram assim distribuídos e foram assim resolvidos:
  • Grupo A: Brasil, Iugoslávia, Suíça e México. O Brasil estrou vencendo o México, empacou diante da Suíça e classificou-se diante da Iugoslávia.
  • Grupo B: Espanha, Inglaterra, Estados Unidos e Chile. Os espanhóis fizeram sua melhor campanha até 2010. Venceram os 3 jogos e passaram sem sustos. Destaque para aquela que é considerada a maior zebra de todas as copas: o time amador dos EUA superaram os inventores do futebol, que até então haviam boicotada a Copa por se acharem superiores aos outros;
  • Grupo C: Itália, Suécia e Paraguai. Quase tudo apontava para uma passagem tranquila dos italianos. Só que a Suécia venceu o confronto direto e passou fácil pelos paraguaios. O sonho do tri teve que ser adiado por 32 anos.
  • Grupo D: Uruguai e Bolívia. Sim, Bolívia. Apenas passar pela Bolívia foi tudo o que teve que fazer o Uruguai para chegar na final.
Pela primeira e única vez na história uma Copa do Mundo não teria uma final programada. O acaso trabalhou para que isso acontecesse. Na primeira rodada do Quadrangular final o Brasil aplicou aquela que é, até hoje, a sua maior goleada: 7x1 na Suécia. Na outra partida os uruguaios evitaram a derrota com um gol de Obdúlio Varela aos 28 minutos do segundo tempo, ficando no 2x2 contra os espanhóis. Era a sina da Celeste chegar ao Maracanã depende só de si...

Na segunda rodada veio o que é considerado por muitos o maior baile que já aconteceu na história das Copas: quase 200 mil vozes cantando "Touradas em Madri", composição de João de Barro, enquanto o Brasil enfiava 6x1 na Espanha. Quem viveu aquela tarde de 13 de Junho morreu garantindo nunca ter vivido nada igual. Foi uma epopeia. Fosse a final da Copa nada seria mais perfeito. E o Brasil quase fora campeão naquele dia, pra dizer a verdade. 

No mesmo horário a Suécia e o Uruguai ainda tinham, digamos assim, esperanças na Copa. Mais os uruguaios do que os suecos, pois o saldo destes era bem ruim. Mas os nórdicos poderiam ser, ao menos, vice-campeões caso vencessem os culés. E assim acontecia até os 32 minutos do segundo tempo. Quando a mística da camisa celeste apareceu de novo: Míguez empata aos 33 e vira aos 40. Se este último gol não tivesse saído, o Brasil poderia perder por impensáveis 5x0 que ainda assim seria campeão. Mas com o 3x2 o Brasil poderia empatar. Algo que sequer passava pela cabeça de qualquer torcedor naqueles dias até a final.

Os dias entre aquela quinta e o domingo custaram a passar. Todos queriam estar no Maracanã para a coroação do time de Flávio da Costa, técnico, e de estrelas como Zizinho, Ademir da guia, Danilo Alvim e cia. Era questão de tempo e ver o Capitão Alfredo levantar a Jules Rimet diante da multidão ensandecida. Mas ainda tinha o Uruguai. Que nem era considerado forte o suficiente para vencer o Brasil, mas que deveria ser... afinal, em 3 amistosos antes da Copa as duas seleções, o resultado foi sempre equilibrado, e o Brasil perderam um e empatara outro. E até aqueles dias, tinha mais vitórias do que derrotas pro Brasil. Mas ninguém poderia nos tirar aquela Copa. Pois é... 

A Seleção ficara concentrada em uma Chácara na Floresta da Tijuca, longe de tudo e de todos. Mas a primeira providência dos cartolas foi levá-la para São Januário, campo do Vasco. Barbosa disse pouco antes de morrer que a seleção saíra do céu diretamente para o inferno. No domingo só faltou arquibancada para ver os campeões do mundo tomarem café. Diversos políticos foram a "concentração" ( era ano de eleições para Presidente, Governador, Senador e Deputados ). O Jornal do Sports veiculou no sábado a tarde com a foto dos campeões do mundo. A tragédia estava preparada.

No jogo em que decidiu o terceiro lugar, a Suécia venceu a Espanha por 3x1, mas ninguém nem ligou. Curiosidade: a partida foi disputada no mesmo horário da final. 

Com a balburdia generalizada, Flávio da Costa retirou o time de São Januário às 11:00 da manhã para poder ter algum sossego e trancá-lo nos vestiários do Maracanã, onde deu ordens expressas para ninguém entrar. O time estava, psicologicamente derrotado. As 200 mil pessoas ( ou mais, nunca saberemos ) foram assistir uma homologação. De preferência, com uma goleada.

Obdúlio Varela ( foto abaixo ) inflamou os brios de seus companheiros ao mostrar a capa dor jornais, onde todos diziam: Brasil campeão. De fato não precisava de muito mais para motivar uma equipe aguerrida como a uruguaia.

Capitão Alfredo e Obdúlio Varela antes da partida...
O clima era de festa, mas o time não engrenou e além disso o time adversário era bom, mesmo que ninguém acreditasse naquele estádio acreditasse nisto. Um primeiro tempo morno foi o que a plateia presenciou, com este chute de Zizinho sendo a melhor chance do Brasil:


No começo do segundo tempo, Friaça fez o gol que desafogou o nó na garganta. Só que a goleada esperada não veio, o Uruguai seguiu pressionando e o Brasil não passou a jogar melhor. E tem a lenda de que Obdúlio tenha esbofeteado o lateral Bigode. Os dois lados negam, mas sabem como são as lendas...

Aos 21 minutos, o baque: Gigghia avança pela direita, corta Bigode e cruza. Schiaffino antecipa a Juvenal e fuzila Barbosa. 1x1 e a massa sente. Mas o time em campo sente ainda mais. Pressionado por dar espetáculo, o time segue no ataque, afinal era preciso dar show. E aos 35, a tragédia final... eis as fotos e acho que todos conhecem a história da jogada:




Poucos jogadores do passado eu gostaria ter conhecido quanto Moacir Barbosa. Que nas palavras dele mesmo foi condenado a maior pena da história do Brasil livre: até sua morte em 2000, a pena já durava quase 50 anos. Todos apontaram para ele, como o culpado maior pela derrota. Mesmo que Bigode tenha sido engolido por Ghiggia, mesmo que Juvenal tenha falhado bisonhamente na cobertura, mesmo que Ademir de Menezes tenha perdido uma chance incrível 3 minutos antes, mesmo que... pois é, a culpa foi de todos e de ninguém. Barbosa explicou em uma entrevista o lance e eu assisti: "quando Ghiggia avançou eu imaginei que ele iria cruzar, como no primeiro gol. E eu sai um pouco de perto da trave e olhei pro meio da área, buscando ver onde estaria Schiaffino que mercara o gol de empate. Nesta fração de segundo, quando eu procurei por Ghiggia ele estava com o chute armado. Caí na bola, mas tive a certeza de que ela entrara antes mesmo de tocar nela." Pobre Barbosa, não contava com a falha de Juvenal, que hesitou em dar o bote e permitiu ao carrasco avançar ainda mais.

Eram 35 minutos. Ainda faltavam 10 minutos ( acréscimos na época não faziam parte da regra ). Mas o silêncio, relatou Armando Nogueira, Zagallo e Pelé ( este pelo Rádio em Três Corações onde sua família moravam ), era ensurdecedor. Tinha tempo, mas faltava ânimo. O Brasil estava batido, derrotado ainda em jogo. O máximo que se conseguiu foi uma bola alçada na área e que o Queixada ( apelido do pernambucano Ademir ) desviou raspando a trave de Máspoli, goleiro da Celeste. E veio o fim da partida. E a festa dos uruguaios. Que, segundo todos os relatos, foi até contida, com medo de uma invasão.


O Uruguai era o campeão. E de uma certa forma, bi-campão direto, pois era a segunda participação e de novo eles eram campeões. E os jogadores, que poderiam ser heróis até hoje, viraram vilões. Zizinho morreu sem saber explicar o que acontecera. E nem sabe como foi parar na sua casa naquele dia. Zagallo, que era militar, e estava no estádio de serviço prometeu que iria ser jogador da seleção. Um garoto de 10 anos prometeu ao seu pai que que iria vencer uma Copa, para consolar seu velho aos prantos. Os dois estariam juntos em 58 e, de fato, vingariam aquela derrota. Mas isso é papo para quarta-feira...

Para finalizar, um fato insólito: não houve premiação. Sim, não houve. Todo o cerimonial preparado visava apenas premiar os heróis brasileiros. Com a derrota os dirigentes simplesmente saíram de campo e deixaram os campeões lá, sem a Taça. Foi preciso que Jules Rimet descesse das tribunas do estádio e entregar a Taça com seu nome ao Capitão Obdúlio Varela, como mostra a foto:


O Artilheiro

O pernambucano Ademir de Menezes em ação contra a Espanha
Pela primeira e única vez na história das Copas, uma seleção teve artilheiros consecutivos. Após Leônidas na França, Ademir de Menezes colocou o Brasil na lista de artilheiros. E aumentando em 1 marca do Diamante Negro, ao marcar 9 vezes. Nenhum brasileiro ou sulamericano marcaram tanto em uma Copas. O "queixada" foi as redes como poucos nas história das Copas. Em 6 partidas ( não atuou contra o Suíça, substituído por Baltazar ) só não marcou justamente quando mais era preciso: na final.

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